quinta-feira, 21 de junho de 2007

Cinco e meia e meus olhos se abrem

automaticamente sem que eu possa determinar o que quero. Tudo ainda escuro, aliás mais escuro do que de costume. Deve ser esta minha velha mania de não abrir os olhos quando não há luz. Engraçado, não sinto cheiro de nada. Talvez ainda esteja dormindo. Só vejo sombras, abro mais os olhos, tenho certeza de que estão abertos. Tateio buscando encontrar alguém mas não encontro em minha lembrança nenhuma referência sobre quem deitou-se ou deveria ter se deitado comigo. Só encontro um vazio, pesado e enorme. Um vazio que agora começa a me incomodar. Que sensação é essa? Meu coração está acelerado, um calor saindo das minhas narinas. O que aconteceu? Meu quarto parece que mudou de forma, não vejo as paredes, vejo um cinza fuligem que não tem fim... Será que bebi? Não consigo apalpar nada, as formas se movem quando tento pegá-las! Vejo traços de rostos de velhos conhecidos nestas formas. Sinto o suor brotando na minha testa, no meu buço. Devo ter bebido...não me lembro! Sinto de volta algo que só senti quando minha filha foi rejeitada na escola, um calor e um vazio, uma certa insegurança e a barriga querendo doer... medo? Até então eu não sabia o que era medo. Me gabava de não temer ser vivo, sem medo dos assassinos que pus na cadeia, nem dos que na cadeia sem terem cometido crimes. Ameaça de ser humano nenhum jamais me abalou. Tampouco me lembro de ter sentido medo de bicho ou seres de outro mundo... agora olho em volta e vejo estas sombras translúcidas, flutuantes, impalpáveis, irreais. Que náusea! Agora sinto até o cheiro podre de mijo e bosta! Argh, aquele cheiro de viaduto habitado pela corja nojenta de maltrapilhos! O que este cheiro está fazendo na minha casa? No meu sonho? Não deve ser sonho, a gente não sente cheiro em sonho, ou sente? Não tenho medo dessa gente, já disse, mas temo a solidão em que elas metem, a rejeição que elas sofrem da sociedade.Tenho medo de morrer sózinha e só ser encontrada quando o cheiro podre encontrar o nariz dos vizinhos. É como agora, estou tentando acordar, não vejo ninguém, não consigo me livrar dessas malditas sombras que insistem em me fazer lembrar só fragmentos de coisas, de pessoas. Milnha filha, os médicos, o crápula! Ai, a dor de sentir-me enganada, traída! Eu que me cria sempre com razão, Eu que achava que conhecia e sabia tudo! Discuti com o preconceito da diretora, sofri com a discriminação e a rejeição contra minha filha, passei a ficar irracional, irada, sem argumentos para conseguir matrícula para minha filha em nenhuma escola! O temor do contágio que não se comprovava que movia aquelas faces mórbidas agora refletidas nessas sombras! Bossais, não passam de covardes, idiotas, ridículos e patéticos, médicos sem diagnósticos, teses absurdas. sanguessugas, vampiros de aventais. Imbecilizados entre receitas e representantes de fármacos, submetendo minha filhinha às torturas medievas e cruéis. Ela ali, quieta, sem gemido, sem queixa! Horas e horas de fila tratamento, exames, espera aflição. Ela cada vez mais careca, isolada, rejeitada pelas crianças, por todos. Estas sombras são a infância que minha filha perdeu dentro de casa. Trazem d evolta minha dor, meu pé pisando na lajota gelada, solta aos pés da escada. è como se eu soubesse tudo em um segundo. Como pude viver tanto tempo sem saber e de repente compreender tudo, num lampejo! Minhas mãos voltam a tremer, ecos dos gritos de horror e lucidez me voltam ao corpo todo. Minha unhas cravadas naquele animal! Seu olhar frio negando. Minha ira me incendeia ainda. Mas, já estou fraca, não sinto a força nos membros, mais. Me pergunto: que brincadeira é essa? que jogo brincavam? Ele viril, entrando em nossa intimidade sem atropelos, se acomodando por falta de conflito. qual o frenesi que movia sua luxúria? Não acreditei! eu o deixei entrar em minha casa, eu o acolhi sem dúvidas nem receios. Agora vejo-o misturado com os fios de cabelos de minha filha arrancados um a um e enterrados debaixo da lajota, ...

5 comentários:

Lidia disse...

uai, como foi que esse texto apareceu aqui?

Ana Silva disse...

Estava no rascunho. Eu vi a marcação do rascunho, mas não podia visualizá-lo.
Agora, fico com medo. Não dá vontade de chorar?

Valéria Barros Nunes disse...

eita! assim de chorar?! sugere uma revisão, aí ele melhora, uai!

Ana Silva disse...

Uia, que malvada!
Chorar de medo das sombras fugidias.

Valéria Barros Nunes disse...

ah pensei q fosse por causa da digitação escabrosa!