quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

p-a-l-a-v-r-a


Fomos condenados à palavra e ela a nós.


A palavra nasce, cresce, mas não morre (apenas se esconde). A palavra vai à escola, senta no banco da indiferença e escolhe quem vai sentar ao seu lado. A palavra não pode ser reprovada e, mesmo não dita, se agiganta para cima de qualquer um que queira ser seu professor.

A palavra morde quem tenta aprisioná-la, arranca-lhe um dedo e lhe transmite a famosa tosse vocabular, aquela que faz com que o cidadão cuspa seguidas palavras que se repelem, como em “quando o grito do prazer açoitar o ar, reveillon”, resultado de uma crise aguda de um tal Djavan. Tem cura, entretanto, a palavra. Não a tosse.

Uma amizade desinteressada com a palavra tem chance de funcionar. Assim então a palavra se deixa flexionar a vontade, se multiplica, forma família, se conjuga que é uma beleza. Mas tudo sem pressa, que a palavra demorou para chegar onde está e teme se perder na boca de qualquer um. Não quer ser um mero morfema.

Drummond queria a palavra "dentro da qual vivêssemos todos em comunhão, mudos, saboreando-a". Não desconfiava ele que a palavra não quer ser comida em suas entranhas, não aceita parasitas da palavra. Deseja ser saboreada sim, mas por fora, por diferentes línguas em cada uma de suas letras, emudecendo os que não foram convidados para o banquete da palavra.

"Tomai, todos, e comei: Isto é a palavra que será entregue por vós".

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A TORCIDA DOS BAGACEIROS

Fabrício Carpinejar

A mulher odeia ser chamada de "gostosa" na rua, da incontinência verbal da sinaleira, de ser alvo de olhares atrevidos e maliciosos, certo?

Errado. A mulher não irá se envolver com nenhum desses homens, manterá distância, não aceitará sequer a conclusão do convite, mas qualquer chamado sonoro de um estranho a fará recuperar a estima e se sentir bem mais magra do que um pão árabe.

Há homens que estão trabalhando secretamente para os namorados e maridos. Os bagaceiros renovam o sentido erótico adormecido pela bolsa no ombro e pela pressa ao trabalho. Fazem suar as mais incrédulas, borrifam de sensualidade as mais céticas, frígidas e pessimistas. Interrompem o juízo final, anulam o fim do casamento, resolvem dívidas e tranqüilizam a nudez.

Até supõem que têm alguma chance, mas não estão seduzindo, estão uivando. O jorro escandaloso de suas gargantas não motiva o respeito. Inofensivos, tal leão-de-chácara em festa de criança. Não serão lembrados, mais um pássaro a cantar no meio de uma migração e desaparecer na velocidade embaraçosa dos telhados.

Entretanto, o efeito de seus apelos indecentes reconduzirá a mulher a reavivar o espelho e se reconciliar com a lycra.

"Ô gostosa" tem o mesmo resultado de um ácido glicólico.
"Tesuda" penetra na pele como retinol.

Os desaforos de rua são cremes caros e instantâneos. Recuperam cinco anos em questão de dez segundos. O que são as plásticas perto de um elogio safado?

Beleza não é beleza sem antes receber a condecoração do trânsito.

Quando abordadas, as mulheres aceleram o passo e atrasam os ouvidos. Lançam o corpo para frente e a audição para trás, a capturar o chamado lânguido pelas suas curvas. Permanecem avançando por discrição. Fazem de conta que não ouviram. A situação é esta: não podem parar, querem e não podem, seria corresponder à grosseria. Resta reconstituir a soma das letras seguindo adiante.

Os bagaceiros teriam grandes chances de vencer concursos de soletração.

Que bun-da.

Abrem a boca ao vento com a submissão de um consultório odontológico. Gritam sem esconder o rosto e a identidade.

São terroristas do corpo. Camicases que explodem junto com as palavras após cumprir a missão do instinto. Arremessam o rojão erótico aos pés das senhoras e senhoritas, putas e virgens, mal prevendo que perderam a chance de conquista com o estardalhaço.

As vítimas dos assobios e insinuações voltam a casa com irreconhecível orgulho. Não contarão nada do que aconteceu aos seus pares, sempre ciumentos, sempre defensivos, sempre educados. Seus amores não entenderiam as contradições do sexo.

Se compreendessem, agradeceriam a torcida dos motoboys, dos ciclistas, dos guris das passarelas, que empurram o time feminino ao ataque.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Noite às 16h30 da tarde!

O vazio da noite escura
aumenta a melancolia das ilhas frias

Com a noite chegando cedo,
parece que os mundos ficam mais distantes

domingo, 1 de novembro de 2009

Mundo globalizado


o salmão que como vem da Noruega
o camarão do Vietnã
o kani da Tailândia
o carneiro, que não como, é do UK
o frango e os ovos também

mamão papaya e limão são do Brasil
manga rosa de Israel
banana é caribenha
kiwi vem da Nova Zelândia
maçãs e morangos são do UK

aspargos do Peru
vagem do Quênia
milho da Tailândia
batatas, cebolas e salsão do País de Gales

azeite de oliva da Itália
molho shoyo é fabricado em Hong Kong
óleo de girassol e atum em lata de Liverpool

geléia de morango e torradas da França
café da Itália ou da Colômbia
café solúvel do Brasil
biscoitos e chá do UK

Stela Atrois da Bélgica
Brahma do Brasil
Singha da Tailândia
Guinness da Irlanda

creme dental Colgate e
produtos da Avon da Polônia
Carefree da Itália
cotonetes da Grécia
sabonete Dove fabricado na Alemanha
xampú made in France
detergente de louça do UK
...
e assim se faz o Reino Unido... com união de produtos...

bem vindo ao mundo transnacional, globalizado, mercantil, de importação.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Enquete sobre a inveja dos gêneros

Sim, sim... depois de meses de árduo trabalho científico, analisando as respostas de milhares de pessoas à pergunta "tem algo que tu invejes nas mulheres / nos homens?" (Ana Cláudia, a pergunta é assim mesmo, à la Drummond), essa sem-noção que vos escreve chegou a algumas conclusões:

1. As mulheres são mais simples do que parecem;
2. Mas nem sempre elas se conformam com isso e, às vezes, até se esforçam para soarem ininteligíveis;
3. Os homens não são tão seguros quanto o James Bond nos quer fazer crer;
4. Porém não são estúpidos como as mães os tentaram moldar.

Abaixo vão as transcrições de 22 respostas (11 homens e 11 mulheres, de 21 a 38 anos, gente casada, solteira, divorciada, virgem, homossexual, heterossexual, moradores de Florianópolis, São Paulo e Brasília). Divirtam-se...



eu: enquete - tem algo que tu invejes nos homens?
ela: fazer xixi em pé
eu: me too
ela: hauhauahau


eu: enquete - tem algo que tu invejes nas mulheres?
ele: hummmm... poder engravidar. no resto não
eu: é mesmo? interessante...
ele: sim. deve ser uma parada sinistramente visceral
eu: só... deve ser


eu: me responde - tem algo que tu invejes nos homens?
ela: tem, a simplificação das coisas. não consigo
eu: não consegue?
ela: é que pra eles tudo parece simples, no meu ponto de vista é diferetne
eu: devo ser meio homem mesmo
ela: kkkkkkkkkkkkkk... e vc?
eu: mijar em pé
ela: bom isso tb, mas é que aqui estou numa situação dessa de simplificação e isso me veio na cabeça agora. kkkkk


eu: enquete - tem algo que tu invejes nas mulheres?
ele: Ah, é o seguinte então: a única coisa que uma mulher tem de melhor é não pagar a conta quando vai para um bar... o mané: "Eu é que pago" e se não pagar, não pega novamente.... rs
eu: mas eu não estava necessariamente falando de uma situação "sexual"
ele: em nada, então


eu: enquete - tem algo que tu invejes nos homens?
ela: não. pq?
eu: sério?
ela: sério
eu: tá bom, não tá mais aqui quem perguntou


eu: tem algo que tu invejes nas mulheres?
ele: heim??
eu: é uma pergunta bem simples
ele: invejo uma coisa, o jeito especial de nos fazer de besta...rsrs
eu: kkkkkkkkkk
ele: e tb, vcs são muito mais bonitas! mas pra que essa enquete?
eu: curiosidade científica
ele: tenho até medo. depois me passa o resultado...rsrs


eu: enquete - tem algo que tu invejes nos homens?
ela: sim, a capacidade deles de não misturarem as coisas e levarem para o emocional, eles lidam com mais racionalidade com os fatos. acho as mulheres muito passionais
eu: isso dá pra generalizar assim?
ela: dá, por mais machista que possa parecer. vc acha que não?
eu: eu não me incluiria nessa descrição, mas concordo que boa parte das mulheres que conheço são assim
ela: entao, eu tb nao me incluiria, mas eu acho que a maioria é. pega por ex, uma chefa e um chefe: a chefa geralmente leva os erros de um funcionário como algo pessoal, contra ela. um homem geralmente nao faz isso. e vc, inveja o que nos homens?
eu: fazer xixi em pé, óbvio. não ter que se depilar...
ela: ahahaha. eu prefiro fazer sentada mesmo. é, depilaçao é um mal necessário... rs. nao ter que parir - isso tb é ótimo
eu: bueno, mas a gente tb não tem que parir... só se quiser
ela: bom, se quiser ter um filho biológico sim. não posso passar essa tarefa para o companheiro. rs
eu: kkkkkkkkkkk, verdade


eu: tá por aí?
ele: to sim, pode falar
eu: enquete: tem algo que tu inveje nas mulheres?
ele: hummm, o orgasmo
eu: por que? tu achas que o da mulher é melhor?
ele: pelo que eu sei vcs possuem o dobro de terminações nervosas que nós, portanto eh melhor sim. IUAHUIhiuah


eu: enquete - tem algo que tu invejes nos homens?
ela: ah, tudo no geral ou partes do corpo?... enfim se for tudo, acho que a liberdade que eles tem com relação aos pais.. menina é muito presa
eu: pergunta para resposta dissertativa
ela: acho que a forma que são criados, a liberdade que eles tem com relação aos pais e ao mundo.. tipo é permitido a eles fazerem muito mais coisas... a mulher tem que lutar muito mais pelo espaço seja na familia... nos estudos, no trabalho, enfim em tudo (quase)
eu: mais ou menos, né? tem coisas que a gente consegue só com um sorriso. malicioso, mas apenas um sorriso
ela: claro, claro.. nós temos nossos métodos kkkkkkkkkk... o q vc vai fazer com essas informações?
eu: vou dominar o mundo
ela: kkkkkkkkkkk


eu: enquete - tem algo que tu invejes nas mulheres?
ele: tem alterativas? ou eh subjetivo?
eu: subjetivaço...
ele: calmae... facilidade de conseguir as coisas
eu: como assim? explique-se!
ele: tah.. nao precisa explicar. eh fato que as mulheres conseguem as coisas mais facilmente do que os homens
eu: como? the pussy power?
ele: kkkkkkkk... no final das contas eh isso mesmo. tipo.. mulher, se quiser viver as custas de um trouxa, ela vive. o trouxa vai sustentar ela pro resto da vida. agora tenta fazer o contrário... heheheheh
eu: homem tb... tem muita mulher trouxa no mercado
...(continuando)
ele: como anda a enquete? satisfatória?
eu: tô tentando não perder os dados, o arquivo não tá abrindo! cacete! isso, por exemplo, é coisa de mulher
ele: kkkkkkkkkk
eu: será que se eu fechar consigo recuperar depois?? (desespero feminino por conta de incapacidade técnica)
ele: tu já salvou?
eu: não!
ele: kkkkkkkkkkkk, lascou então


eu: tá por aí?
ela: sim
eu: tudo beleza?
ela: =) tudo tranquilo!!! e por ai?
eu: certinho. tenho uma enquete: tem algo que tu invejes nos homens?
ela: pera ai... eles nao precisam fazer depilação! hahahahahahaha (se bem que tem uns que fazem né, rsrsrs)
eu: é, tem uns que fazem... e, em geral, ficam ridículos


eu: enquete - tem algo que tu invejes nas mulheres?
ele: a doçura e a flexibilidade
eu: flexibilidade? sei...
ele: sim! de corpo e de mente
eu: qual prevalece?
ele: não sei, talvez a da mente. as mulheres conseguem fazer muitas coisas ao mesmo tempo, pensar em muitas coisas ao mesmo tempo... a do corpo precisa de treino prá permanecer
eu: gostei disso


eu: tem algo que tu invejes nos homens?
ela: mijar de pé, não menstruar
eu: e andar sem camisa na rua? rs rs
ela: é vero. acho que não se estressar com cabelo também é bom. e ir para o clube e não ter que fazer contorno é uma vantagem e tanto também


eu: enquete: tem algo que invejes nas mulheres?
ele: não, não tem..rss...não dá pra ter inveja de um bicho que sangra sete dias e não morre...rs
eu: kkkkkkkkkkkkk
ele: e vc? tem algo que invejes no homem?
eu: queria andar sem camisa por aí e não ser presa


eu: enquete - tem algo que invejes nos homens?
ela: não posso falar agora, tenho reunião. invejo o pinto. queria não precisar me preocupar com o corpo. andar sem camisa no verão
eu: mas o homem não se preocupa com o corpo? imagina... e o complexo do pau pequeno?
ela: peraí, volto depois


eu: tenho uma enquete - tem algo que invejes nas mulheres?
ele: se eu invejo algo nas mulheres?
eu: yeah
ele: eu invejo a capacidade de realizar muitas coisas ao mesmo tempo
eu: mas tu não achas que isso deixa as mulheres meio esquizofrênicas? rs rs
ele: é, mas em muitas vezes vocês levam na boa
eu: e quando a gente não leva na boa, a gente nem leva


eu: enquete - tem algo que invejes nos homens?
ela: a cara de pau
eu: kkkkkkkkkkk. algo mais a acrescentar?
ela: não. fora isso, nada mais
eu: certo, simples e direta
ela: então estamos acertadas, beijocas


eu: oie. então, a enquete é - tem algo que invejes nas mulheres?
ele: Sim. Várias coisas. Gostarias de ser mais específica?
eu: não. é uma pergunta subjetiva, de resposta ampla e irrestrita
ele: hummm. Pera aí. Já vou responder
eu: vais procurar no google?
ele: não. Tô pensando em algo curto e objetivo
Acredito que vocês são seres que conseguem realizar várias tarefas ao mesmo tempo. Uma mulher é muito mais antenada que um homem. Vcs são mais espertas. E isso é o que???
eu: pesquisa
ele: Tá virando produtora de programa de família/barraco na band????
eu: kkkkkkkkkkkkkk


eu: tem algo que invejes nos homens?
ela: TEM.. FAZER XIXI EM PÉ
eu: rs rs... mais alguma coisa?
ela: ter filho sem sentir nada (enjoos, dores e nem se ferrar na hora do parto). sair transado pensando apenas.. "mais uma pra minha lista". eles não tem a capacidade de pensar, "caraca será que serei pai?"... "caraca será que peguei algo?"...
eu: uai, e eles não podem pegar algo??
ela: podem.. mas NUNCA pensam nisso... saem enfiando o pinto em qualquer buraco
eu: credo, que éca!
ela: kkkkkkkkkkkkk


eu: podes me responder uma enquete? tem algo que invejes nas mulheres?
ele: tá falando sério? qual o motivo da pergunta?
eu: pesquisa acadêmica... kkkkkkk
ele: sei... ahahah. algo que eu invejo nas mulheres?
eu: sim
ele: ai... se eu disser que não, vai ficar chateada?
eu: que? que não invejas nada? no problem
ele: pois é... acho que inveja não sinto, não... sinto é ciumes, desejos, essas coisas...
eu: certo, muito obrigada pela sua participação.


eu: tem um minuto?
ela: diga
eu: enquete - tem algo que invejes nos homens?
ela: kkkkkkkkkkkkkkkk. que pergunta capciosa
eu: é uma pergunta altamente científica
ela: hahahahaha, deixa eu pensar...
eu: pense...
ela: acho que o que mais sinto inveja deles é o fato deles não precisarem se arrumar (como a gente se arruma) para ficarem bonitos
eu: vai dizer que tu não repara no jeito que o cara se veste? se ele estiver de regata, pochete e sapato caramelo, tu vais achar o que?? rs
ela: depende, se o cara for gato, ele vai continuar bonitinho, mesmo que vestido de um jeito esquisito. kkk... mas o que me referi, era a ter que passar maquiagem, usar saltos altíssimos... a mulher tem que usar muitas coisas pra agradar a macharada
eu: bueno, eu quase não uso essas coisas e nunca passei necessidade


eu: então, a enquete é: tem algo que invejes nas mulheres?
ele: Só para entender melhor: inveja no sentido de querer ter ou inveja no sentido de que vocês tem vida mais fácil por causa disso?
eu: olha, eu perguntei primeiro... e tu já respondeu
ele: eu não respondi, hehehehe.
eu: respondeu sim
ele: Quando, como e por que?
eu: que mulheres tem uma vida mais fácil pq os homens "as querem". seja lá o que isso for... rs rs
ele: Você tá tirando muita coisa de uma pergunta.
eu: acho que toda mulher tem um quê de psicólogo
ele: A minha pergunta, melhorando (doutora), era: você está me perguntando se eu acho que, por alguma razão, as mulheres tem vida mais fácil que os homens? Se for, a resposta é não. huahuahaua
eu: não, a pergunta não é essa. tens inveja de qualquer coisa que a mulher tenha (ou não) e o homem não?
ele: Mais facilidade para enriquecer sem trabalhar. Brincadeira (não me bate, hehehehe)
eu: não tenha medo
ele: Falando sério agora. Pelo menos pensando no assunto agora, não me vem nada na cabeça.
eu: certo... isso é melhor para a sua saúde. rs rs

Como ser um grande escritor, segundo Bukowski


como ser um grande escritor


tens que foder muitas mulheres
mulheres bonitas
e escrever alguns bons poemas de amor.

e não tens que te preocupar com a idade
e/ou novos talentos.

apenas bebe mais cerveja
mais e mais cerveja

e vai às corridas pelo menos uma vez
por semana

e vence
se possível.

aprender a vencer é difícil –
qualquer imbecil pode ser um bom perdedor.

e não te esqueças de Brahms
nem de Bach nem
da cerveja.

não faças exercício a mais.

dorme até ao meio-dia.

evita cartões de crédito
ou pagar seja o que for a
tempo e horas.

lembra-te que não há nenhum cu
no mundo que valha mais de $50
(em 1977).

e se tens a capacidade de amar
ama-te primeiro
mas nunca te esqueças da possibilidade de
derrota total
mesmo que a razão para a derrota
seja justa ou injusta –

sentir cedo o bafo da morte não é
assim tão mau.

afasta-te das igrejas e bares e museus,
e como a aranha sê
paciente –
o tempo é a nossa cruz,
mais o exílio
a derrota
a traição

tudo isso.

sê fiel à cerveja.

uma amante constante.

arranja uma grande máquina-de-escrever
e enquanto ouves os passos para cima e para baixo
lá fora

martela a coisa
martela com força

transforma-a num combate de pesos-pesados

transforma-a no touro na sua primeira investida

e lembra os velhos sacanas
que tão bem lutaram:
Hemingway, Céline, Dostoievsky, Hamsun.

se pensas que eles não enlouqueceram
em pequenos quartos
tal como tu agora

sem mulheres
sem comida
sem esperança

então não estás preparado.

bebe mais cerveja.
há tempo.
e se não houver
está tudo bem
na mesma.

sábado, 10 de outubro de 2009

Saudosismo, pero no mucho

Hoje, limpando a máquina de lavar (que é um serviço dos piores já realizados por esta que vos escreve), saudosisticamente lembrei do Luis.
O Luis limpava a máquina, afinal, ele era o dono... E o Luis fazia muitas outras coisas: fazia omelete, trocava as lâmpadas, me ensinava a arrumar meus colares, fazia um espetacular miojosoba, etc.
Mas o Luis não matava baratas e, definitivamente, o Luis não me comia.
Eis que aqui estou com o Alex, feliz da vida, limpando a máquina de lavar.

domingo, 4 de outubro de 2009




Pulei o muro do quintal. Já faz tanto tempo que perdi a chave da entrada kkkkkkkkkkkkkkk.


Mas vai aí uma amostrinha do quintal concorrente........ aaaaaaaaaaaaaaaah é de mato mesmo. Mato, plantinhas, plantas e plantões....


Tem mico. Já dá para ver da janela da sala. Demais bichos do quintal primeiro estão convidados para a festa da laje. Data e horário a se confirmar. Tem cachu bem pertinho, tragam roupa de banho. Cada convidado tem direito a plantar uma árvore e pegar um bicho de pé.
Venham todos. Última chamada do trem na franja da encosta cor de laranja e capim cidreira pra fazer chá.
Chuá chuá chuá. Quem quer pão? Quem quer pão? Quem quer pão?

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Comentários sobre o cancelamento da prova do ENEM


jane
| 01/10/2009 08h42
Foi melhor assim, pois se aconteceu isso foi porque Deus tem algum propósito para nós, e não era justo alguém se dar bem roubando enquanto outros se matam de estudar...... boa prova para todos.

LEO AGUIAR DE OSASCO | 01/10/2009 08h42
Isso não é novidade, acho que quem vazou foi o Sarney.

Jose sarnney | 01/10/2009 08h39
viuuuuuuuuuuu? por isso sou politico.Nao e preciso estudar para ser desonesto.Quem foi que vazou a prova?Zero para ele....nao soube guardar segredo.Nao serve nem para ser meu acessor

Bruno | 01/10/2009 08h44
UFA!!!

51 | 01/10/2009 08h44
A culpa é do Pinguço do Lula

Bianca Queiroz - RJ | 01/10/2009 08h50
Até que demorou...Estava tudo dando certo de mais, estava até estranhando!
Corrupção aqui tá no DNA! Se por acaso a proposta de redação da prova cancelada tinha algo a ver com orgulho de ser brasileiro, relacionando com olimpíadas e tal... esquece pra próxima prova!
O bom é que teremos mais tempo.

Filipe Hobi | 01/10/2009 08h50
Não poderia ter sido cansaleda,uma falta de desorganização,30 milhões jogados fora,E se no novo dia do enem eu ja tiver outro vestibular agendado,vou poder ter o reempouso??????????

MMonica | 01/10/2009 08h55
Como reclamar dos nossos governantes se eles são nossos espelhos.
É incrível a capacidade que as pessoas têm de serem desonestas, de prejudicar os outros.
Fico feliz que a prova tenha sido cancelada, antes que os estudantes tenham feito, e espero um dia que essas coisas deixem de acontecer.

eduarda | 01/10/2009 08h54
Eu achei bom demaiss, pq tava morrendo de preguiça de fazer...
kkkkkkkkkkkk

Karina | 01/10/2009 08h56
Pô Dexei De ir Para O Campol De Morobá ,Em Um Acampamento Da IASD
La Vai Esta Leandro Quados Iveline etc..
e O ENEM foi cancelado Não entendir Porque agora Ficar em Casa Fazer O Que Acabou a Vaga Dos Onibus...Beijos Que Deus Eteja Com Todoss

Seu madruga | 01/10/2009 10h02
Não é de hoje que o ENEM virou um ´Ahhh... NEM´

Pyther | 01/10/2009 10h08
Vou poder ir ver o jogo do Palmeiras no domingo!!!

celso | 01/10/2009 10h10
Roubarem uma prova de tamanha importância não me surpreende!querem um roubo pior?
Uma senhora de manhã cedo foi varrer a calçada de sua casa,e passou um ladrão e tomou e roubou das mãos da senhora a vassoura nova que tinha comprado,nem varrer a calçada de manhã é possível nesse país.

Danielle | 01/10/2009 10h13
gostaria de saber o que vão fazer com tanto papel já gasto com a impressão das provas anuladas??/ agora gastarão mais e mais papel..... quanta falta de cuidado! Além do que teremos de aguardar outro dia e novas datas de outros vestibulares.. só falta coincidirem, daí tá feita a merda completa!

Paulo Sérgio | 01/10/2009 10h13
RONALDO!!!

Fabiano | 01/10/2009 10h16
Eu achei massa, pois agora vou pro maraca ver meu Mengão sem peso na consciência, pois mesmo que tivesse o ENEM eu iria pro maraca :)

FLAVIO | 01/10/2009 10h17
BOM AGORA POSSO R PRA PRAIA PEGAR ONDA..

Rafael Luiz Riani | 01/10/2009 10h17
É o valor do conhecimento difundido no Brasil: se der pra ser sem esforço, tanto melhor.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Tu controlas?


a ira? a inveja? o medo?
a libido?
o dinheiro?
o riso? o choro?
a tv? a internet? o celular?
os olhos? as mãos? os intestinos? a língua?
o superficial? o profundo?
os dias? as noites?
os cabelos?
a agenda?
as chuvas? as marés?

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Serviço militar no UK

Antes de iniciar o filme no cinema assistia os trailers tranquilamente, até que um me pareceu a divulgação de mais um filme de guerra, mas era propaganda oficial pra recrutar rapazes e moças ao serviço militar. E serviço militar aqui é ir pra guerra, lutar no Afeganistão eliminando os Talibãs e os camponeses que lá vivem.

O trailer apresentava um guri camuflado em uma selva e um homem que se assemelhava um aborígene-indiano com o rosto pintado de branco no meio de uma grande poça. O homem estava de frente ao guri e com ar de "já ganhei essa parada", pois só via um só "inimigo", até que de repente sua suposta felicidade acabará pois estava cercado por mais uns seis guris que saíam detrás das árvores na mata densa.

Não me lembro a mensagem exatamente mais como outras que encontramos é mais ou menos assim: "Servir nas Forças armadas pode ser a melhor decisão que você faz", "Eles (militares) estam fazendo algo por você. E você o que tem feito para o país?" uauuuuu as meninas engravidando e os meninos enchendo a cara. A Grã-Bretanha tem o maior índice de gravidez na adolescência dentro os países da Comunidade Européia e tem agora um outro problema a bebedeira dos adolescentes, mesmo sendo proibido vender bedidas para menores de 18 anos nos Pubs e comércio em geral.
Mas voltando ao assunto recrutamento militar. Registramos um momento tem festejo para receber os soldados que voltam vivos do Afeganistão. Na pequena cidade onde estamos fecharam a rua principal e sob um sol raro de Julho desfilaram os soldados que eram saudados com palmas e flores.

Todo soldado que perdeu sua vida no front é anunciada pelos telejornais.Imagina se nos jornais das grandes cidades do Brasil vão anunciar os meninos que morrem todos os dias ou as vidas perdidas em algum país da África nas guerras civis ou com fome.

Em Santiago no Chile presenciamos algo parecido, o falecimento de um policial foi anunciada em todos os telejornais e foi discussão na Assembléia Geral. O policial foi morto em confronto com os manifestantes que homenageavam Allende, morto em 11/09/1973.

Enquanto isso, Gordan Brown continua com a decisão de permanecer com os soldados no Afeganistão. De acordo com "The Times", a Rainha não concorda com essa decisão, até mesmo porque os meninos da realeza serviram e estão servindo no Afeganistão. Enquanto o príncipe William vai para Ilhas Malvinas fazer treinamento, o príncipe Henry, o terceiro na sucessão, vai pro Afeganistão.

Dentre as curiosidades tratadas nos telejornais ou no site das Forças Armadas (www.army.mod.uk) estão:

1) A preparação dos suprimentos que são enviados para os soldados no front, destaque para as chips. Imaginei a combinação: os guris armados comendo sua batatinha no meio de uma terra árida, com algumas cabras magras e camponeses islâmicos.

2) Uma adolescente que serviu no Iraque, hoje com 22 anos foi o segundo lugar no concurso Miss Inglaterra 2009. A guria de nome Katrina é apelidada como 'Combat Barbie' faz comercial de lingerie, mas diz que ama as forças armadas, que seu trabalho é ser soldada e que tudo isso incentiva outras mulheres a servir militarmente.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

domingo, 19 de julho de 2009

Culpa do Lúcio e da Bianca...

Tempos atrás, quase sou expulsa do Quintal de Casa por improdutividade. Chegaram até a dizer que eu só estava aqui por uma questão de status! Agora o Lúcio e a Bianca inventaram uma missão. Olha aí:

http://jaana-fernandes.blogspot.com/

Resolvam-se com eles! ;)

Bjim

quinta-feira, 9 de julho de 2009

born to be legends

O primeiro a chegar foi o saci, pulando na frente de todos. Sentou bem perto da poltrona. Depois foram chegando outros: chapeuzinho vermelho, boitatá, lobisomem, a loira do banheiro, papai Noel, a mula-sem-cabeça, seis dos sete anões (Dunga estava na granja Comary), o negrinho do pastoreio... Alguns vinham pela primeira vez: chupa-cabra, monstro do Lago Ness, Elke Maravilha, o cabeça-de-cuia, bozo... Todos numa pequena sala de um prédio imponente numa cidade descrente. Papai Noel reclamou que estavam chamando gente demais, que o lugar estava ficando muito apertado e não sei o que lá... Os anões que, juntos, não ocupavam metade do mesmo espaço, disseram a ele que deixasse o saco de fora, do lado de fora. O bom velhinho não achou a menor graça na piada dos fedelhos, que é como ele carinhosamente os chama. A loira do banheiro disse que poderia ocupar o mesmo lugar que qualquer um dos outros ali presentes, que com ela não tinha essas coisas de leis da física não... mas nem o chupa-cabra gostou da ideia. Chapeuzinho estava achando que o monstro novo no pedaço era muito grande e que ocupava mesmo muito espaço. Argumentou que ele deveria virar "monstro do Lago Ness-sem cabeça" ou "monstro do Lago Ness-sem-rabo" ou algo assim. Sensível que é, o pobre disse que iria se retirar, que já havia percebido o incômodo dos outros com a sua monstruosa dimensão. Quem o defendeu foi o Bozo: "Não, não! Fica aí! Essa pirralha tá pensando o que? Olha, já trabalhei com criança e sei bem como é - não pode dar folga. Se deixar, nego monta encima!" Já estava começando um tumulto generalizado, quando o delegado, aquele, entrou e sentou na sua poltrona de couro. Todos foram se calando. Soneca se aproximou do lobisomen e perguntou, baixinho: "Será que hoje é a fábula do Dantas?"; "Não, fiquei sabendo que hoje ele vai começar um tipo de epopeia às avessas. O personagem principal se chama Barney... ou Sarney... sei lá".

sábado, 4 de julho de 2009

para Ana Cródia, diretamente da Flip


Querida, tá vendo essa foto? Por trás dessa gente, em fila se aplastando, tem mais gente. Gente que aguardava seus segundos junto ao Chico para conseguir um autógrafo e, quem sabe, uma mirada mais direta.

A mulher de azul e roxo, segurando a versão alaranjada de seu último livro, foi uma das primeiras a sair da fila. Provavelmente não assistiu à mesa em que o próprio Chico e Milton Hatoum engataram uma boa conversa sobre as semelhanças de seus livros e as semelhanças das falcatruas em diferentes épocas e partes do país. Pra mim, ela perdeu. Pra ela, definitivamente, quem perdeu fui eu.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Formato Mínimo

Começou de súbito
A festa estava mesmo ótima
Ela procurava um príncipe
Ele procurava a próxima

Ele reparou nos óculos
Ela reparou nas vírgulas
Ele ofereceu-lhe um ácido
E ela achou aquilo o máximo

Os lábios se tocaram ásperos
Em beijos de tirar o fôlego
Tímidos, transaram trôpegos
E ávidos, gozaram rápido

Ele procurava álibis
Ela flutuava lépida
Ele sucumbia ao pânico
E ela descansava lívida

O medo redigiu-se ínfimo
E ele percebeu a dádiva
Declarou-se dela, o súdito
Desenhou-se a história trágica

Ele, enfim, dormiu apático
Na noite segredosa e cálida
Ela despertou-se tímida
Feita do desejo, a vítima

Fugiu dali tão rápido
Caminhando passos tétricos
Amor em sua mente épico
Transformado em jogo cínico

Para ele, uma transa típica
O amor em seu formato mínimo
O corpo se expressando clínico
Da triste solidão, a rúbrica


(Samuel Rosa - Rodrigo F. Leão)

segunda-feira, 8 de junho de 2009

e por falar em quintal...

Era uma vez uma frô. Ela vivia bem plantadinha num quintal.
Um dia lhe apareceu uma dona engraçada chamada abelha, que dizia conhecer distantes quintais. A frô perguntou como é que podia um trem daquele - aí que a dona abelha explicou a coisa toda de voar. Com cara de abobalhada a frô ficou... e sentiu uma invejazinha lhe roendo as raízes. Dona abelha, mui vivida, tomou ciência do que se passava com a frô e propôs uma tal de polinização. A outra, claro, não sabia que diabo era aquilo. "Explico" - disse a abelha - "Pouso nas tuas pétalas, cubro meu corpo todinho com o teu pólen e levo um pouco de ti pra passear em cada flor de cada quintal".
E assim que foi que a frô se desprendeu e se espalhou por aí por tudo.

"Depoimento" que escrevi pr'uma frô chamada Silvinha

sábado, 6 de junho de 2009

Um quintal abandonado pode ser bonito?
A grama cresce, a esmo.
As jardineiras, ocupadas com outros jardins.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Apenas um sorriso


Sem cartas
Sem choro
Sem tristeza
Sem mágoa
Sem brigas
Sem passado
Sem futuro
Sem conversas
Sem promessas
Apenas uma sorriso
Mesmo que amargo
Mas que não se enxergue essa amargura
E sim, somente os dentes.


quarta-feira, 6 de maio de 2009

Você já foi ao Acre hoje?

Acre, segundo a Desciclopédia:

"¿Tienes trueco pra una nuetita de dez?"
Diplomata boliviano, concluindo a negociação da transferência do território acreano para o Brasil
"Xi, acabou o troco... O senhor aceita bala de goma?"
Diplomata brasileiro, usando pesadas táticas de negociação

"Você quis dizer: Terra do Nunca"
Google Earth sobre Acre

"Você quis dizer: Nada"
Google sobre Acre

"Isso non ecziste!!!"
Padre Quevedo sobre o Acre

"404 Not Found"
Internet Explorer sobre Acre

"Lembrei do local onde perdi os minhas botas..."
Judas sobre Acre

"Fronteiras do Acre: El Dorado ao norte, Atlântida a oeste, Sodoma e Gomorra ao sul, Camelot a leste."
Atlas Universitário sobre o Acre

"Você traiu o movimento existencialista, véio!"
Dado Dolabella sobre Acre

"Foi lá que eu aprendi portugês!"
Carla Perez sobre Acre

"Acre? Isso é lenda!"
Curupira sobre Acre

"Recebemos mais turistas por ano que eles."
População de Atlântida sobre Acre

"Só acredito vendo!"
São Tomé sobre Acre

quinta-feira, 23 de abril de 2009

meu horóscopo de hoje

Conferindo no horóscopo se posso sair de casa hoje... ele manda eu gravar e publicar um cd, hoje ainda!
Fácil: entro no wikipedia e escolho um artigo aleatório, seu título é o nome da minha banda: Tufão Rammasun; entro no en.wikiquote.org e as últimas palavras são o título do meu album: Not to Bind Them (em inglês é mais chique, bien sür); entro no flckr e escolho uma entre as sete fotos q aparecem na tela: esta é a capa. Pronto: meio caminho andado...

segunda-feira, 20 de abril de 2009

continua

porque no meio do sonho a gente pegava fogo

porque no meio do incêndio a gente virava filme

porque no meio da história a gente pulava corda

porque no meio do salto a gente inventava regra

porque no meio da ordem a gente cantava distração

porque no meio da noite a gente cantava, inventava regra, pulava corda, virava filme e pegava fogo

porque no meio do sonho

antes do fim da história

com a corda ainda no ar

distraidamente

a gente pegava no sono

quinta-feira, 12 de março de 2009

Por uns cobres a mais

Fumava feito uma chaminé, e os familiares perturbavam-na por conta do hábito. Diziam-lhe que ainda iria morrer por causa do cigarro; era escrava do vício. Não ligava a mínima.

Tinha cinzeiros espalhados pela casa toda. Desses de vidro, que se compram em lojas de quinquilharias. Aos poucos, foram-se todos, quebrados ora numa limpeza, ora num esbarrão, ora por uma visita distraída.

Certo dia, viu-se sem cinzeiros e fez a coisa mais detestável que fazem os fumantes: bateu as cinzas num copinho com água. Enojada, resolveu reabastecer a casa – em cada cômodo, um cinzeiro, pronto.

Foi diretamente a uma loja onde sempre comprava os tais cinzeirinhos vítreos. Não havia, acabaram-se. Toca pra outra. Não temos, disse a vendedora. Está em falta, na terceira. Estranho. Não há cinzeiros nesta cidade?

Decidiu levar uns de cobre; vêm três num saquinho, ainda mais baratos do que os de vidro. Encheu a casa com eles. Sentava-se na sacada do apartamento, diante do mar, e fumava tranquilamente seu cigarrinho.

Alguns dias depois, percebeu que os cinzeiros novos estavam se enegrecendo. Maldita maresia, esqueci-me disso. Foi então que teve a ideia de passar esmalte de unhas nos objetos. Isso vai criar uma película protetora, imaginou. E assim o fez. Logo, todos os recipientes estavam envernizados, secando ao sol. À noite, já estarão bons, calculou.

Fim de jornada, antes de dormir, fumou seu indefectível último cigarro do dia. Apagou-o num dos cinzeirinhos recém-envernizados, mas não de todo. Restou uma brasinha, não percebida, que ficou ali, fumegando, misturando-se ao esmalte e ao zinabre anterior.

Dessa mistura, expeliu-se um gás asfixiante que tomou conta de todo o quarto. Morreu dormindo, sufocada pela fumaça desprendida do cinzeiro. No velório, a irmã lamentava: Não disse que o cigarro ainda a mataria?

sábado, 7 de março de 2009

mania

Esbarrei num sujeito “dazantigas” hoje. Um amigo bizarro que gostava mesmo era de rádio. Quando a Internet ainda era uma idéia, ele achava que só daria certo se a rede transmitisse uma boa rádio, e se fosse via rádio, pois telefone nem chegava a todos os lugares do país. E mais, a Internet era apenas o rádio melhorado, saca um rádio com teclado? Para ele rádio era o veículo de comunicação mais completo. Nossos gravadores National, orgulhosamente portados, por mais que tivessem auto-stop, rewind automático, auto-eject e até pause, não eram nada não fosse pelo rádio. “Tem que tá sintonizado”. Dizia que só via rádio podia-se, por exemplo, efetivamente fazer ensino a distância, o resto era complementação. Inclusive, a escola era complemento do rádio, e não o contrário (rádio como recurso para educação escolar). Assim ele pensava e continuou pensando enquanto os séculos viravam.
O sonho de ter sua própria rádio esbarrou na realidade concreta e se despedaçou em pequenas peças de locução que ele transmitia dentro do próprio carro, seu único veículo ao longo da vida. As transmissões da rádio iniciavam logo cedo, a caminho das escolas das filhas e se estendiam, houvesse ouvintes ou não, durante os curtos trajetos do dia. Aos poucos, suas filhas tiveram programas inteiros para ler o horóscopo ou relatar passeios da escola, as colegas de carona viravam convidadas especiais em programas de entrevistas, e todo mundo entrava na brincadeira. Por fim, a rádio passou a ser transmitida também fora do carro e os “causos” pitorescos se acumulavam, como aquele com o guarda rodoviário que acabou entrevistado ao vivo, em plena blitzen; a gravação da entrevista daquele tio que reaparecera depois de andar sumido por trinta anos e ele só responde puff, nham, ham-ham, mmmmm, ahn! A família se divertia muito mesmo.
Com o tempo, a coisa foi ficando mais profissional, com leitura do prefixo, vinhetas, chamadas da programação, intervalos para ouvir as músicas do cassete player (roadie star, modelo anos 70). Adquirido um microfone caseiro para o “3 em um” da Phillips, já eram até editadas fitas com anúncios, dingles, e seleções musicais! “Sua mãe informa: amanhã será feita des-inse-ti-za-ção TOTAL! Vamos acabar com as baratas! Para seu melhor conforto e saúde! Solicita-se, no entanto, aos proprietários de quartos na casa, que facilitem a entrada dos profissionais recolhendo suas calcinhas do chão!” (segue Michael Jackson: Thriiiiiiiiiiller! ”) “Os famosos Doces da Vovó: hoje, em oferta no Lanche das Cinco” (segue: “Just a Spoon Full o’ Sugar”).
Se não me engano, na nossa última esbarrada a transmissão da rádio já tinha passado a ser contínua, 24 horas no ar. Daí, onde não havia botão de desligar, a pedido do público ouvinte, foi instalado, pelo menos, um botão de controle de volume, acionado por Autocontrole Remoto Ótico: era no olhar das pessoas que ele percebia a hora de baixar o volume, já que não conseguia mais parar de transmitir. Assim, suas locuções tinham virado resmungos e as músicas eram “humminadas” o dia inteiro para os caros ouvintes colegas na empresa de tevê, onde ele sempre foi considerado ótimo técnico, apesar de meio “no ar”.
Acabou que a rádio nunca deu lucro, nem subiu no poste, nem alcançou lugar nos satélites, e não passou do que chamamos de rádio “prosprópriosbotões”. Os poucos de nós que temos antenas para captar essas ondas, quando esbarramos botões nos botões num abraço com esse sujeito, sabendo-nos ao vivo, no ar, transmitimos um alô aos rincões deste planeta mandando um abração pros nossos queridos vivos. Só para terminar, mandamos um beijão pras tias e pros tios. E, manda avisar lá em casa que o pior já passou, estamos bem! As crianças andaram adoentadas, mas era coisa que comeram demais, não é pra preocupar. E, já acabando, tá todo mundo sem férias aqui, este anzim bi zin bi ziiiiiiiiiiiiiiiiin nhoooooooooooooooziiimmmmmmmxxxxxxxxxxxxxxxxxx

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Sem um bocado de tristeza não se faz um samba










Eu era uma pessoa feliz. Cantava muito, várias vezes ao dia. Curtia axé, música que me fazia rir, além de dar uma vontade danada de dançar, sair de casa, paquerar. Alegria, letras divertidas, engraçadas, mesmo as de amor, levantam o astral da gente, a vontade é de sorrir sempre. O máximo que se sofre é com alguma baladinha mais romântica da Ivete Sangalo.


Muito feliz, era eu, até o dia em que se mudou uma moradora para o apartamento ao lado do meu. O prédio é pequeno, a gente tem de tomar cuidado com o barulho, quase sempre dá para ouvir o programa de TV ou a música do apê vicinal. Eu escutava meus discos num volume alto, reconheço, todo mundo gosta de axé, não é? Nunca me preocupei porque ninguém reclamava. A vizinha tampouco. Mas, depois de algum tempo, também pôs música a tocar.

Aí começou meu calvário. Ela gosta de MPB das antigas, Bossa Nova, samba, alguma coisa latino-americana, por aí. Um sofrimento sem fim, uma tristeza. Comecei a sofrer com os retirantes nordestinos, um tal de Edu Lobo, borandá que a chuva não chegou, pra acompanhar Asa Branca, do Luiz Gonzaga, um cara que só faz a gente chorar, saudade amarga que nem jiló, o meu remédio é cantar.

Tive de aprender história do Brasil, sofri tanto com a ditadura militar! Ora João Bosco e Aldir Blanc, na voz de Elis Regina, falando de exilados e do irmão do Henfil, ora Geraldo Azevedo cantando a metáfora do regime de exceção. E eu pensava que já vou embora, mas sei que vou voltar, amor, não chora, era só uma música de amor... E o Gil? Ele verteu um reggae jamaicano para o português só para falar dos amigos presos, amigos sumindo assim pela ditadura, ô gente que gosta de cantar desgraça.

Estranho, ela não parece muito triste, a vizinha, uma coroa assanhadinha que usa roupas curtas e coloridas. Mas deve ter a alma em prantos, não é possível alguém ouvir essas coisas e não sofrer. Naquela voz grave e tristíssima da Mercedes Sosa, a Alfonsina se mata no mar, sabe diós que angustia te acompañó, que dolores viejos calló tu voz? Quem é que não se acaba de tanto chorar? Ah, em espanhol, ela também ouve Silvio Rodrigues, o cubano, minha Nossa Senhora da Revolução, quase desidratei de tanto choro com a versão do MPB4, esse amor é tudo quanto tenho e, se eu vendo ou empenho, para que respirar?

A vizinha passou o carnaval ouvindo Nana Caymmi, alguém acredita? Um sofrimento que não acaba mais, sussuarana, meu coração não me engana, vai fazê cinco sumana, tu não vorta nunca mais, junto com a Maria Bethânia, coisa mais dolorosa. Fiquei macambúzio durante toda a folia só ouvindo a baiana cantar boleros.

Por falar em baianos, ai, meu Senhor do Bonfim! Eu achava que a Bahia era só axé. Mas é um desespero, por exemplo, esse Dorival Caymmi, a gente faz o que o coração dita, mas este mundo é feito de maldade e ilusão. Que aperto no peito! Olhe, Caetano Veloso cantando que sobre toda estrada, sobre toda sala, paira, monstruosa, a sombra do ciúme me deixou os olhos úmidos por dois dias seguidos. Almas esticadas no curtume? Valha-me, minha Nossa Senhora da Penha.

Agora, as músicas de Maysa estão de volta ao sucesso, por conta da série de televisão, mas eu conheci aquela pérola de tristeza do Tom Jobim e Aloysio de Oliveira de que ando bebendo demais, que não largo o cigarro e dirijo meu carro com a Ângela Ro Ro. Eita, que até os pops que a vizinha ouve são tristes.

Mas o pior de todos é o tal do Chico Buarque, de quem ela tem mais discos. Com esse cidadão, tive de sofrer com os sem-terra, levantados do chão, como em sonho perder a passada e no oco da terra tombar? Descobri que tem sem-terra até em Portugal, que coisa! Da ditadura brasileira, então, nem é bom falar, é uma verdadeira aula de história e de sofrimento. É o Stuart Angel torturado com fumaça de óleo diesel pra cá, a Zuzu Angel, essa mulher que só queria lembrar o tormento que fez o meu filho suspirar pra lá! E sangue nos olhos e lama nos sapatos é pra se matar, não é?


E o suprassumo da melancolia, saudade do que ainda não se viveu (como é que alguém imagina saudade do futuro, minha gente?). Tive de pegar licença de três dias no trabalho depois de acreditar que o dia vai raiar só porque uma cantiga anunciou: não conseguia parar de chorar!

Não vou nem comentar as músicas de amor, caso contrário, eu ardo de desejo ou perdemos a noção da hora. Começo a me perguntar de que romance antigo me roubaste e penso que na verdade não me queres mais. Não dá, arrasa o meu projeto de vida. É loucura, às vezes, acho que a vizinha perdeu a saia, perdeu o emprego, bebeu veneno e vai morrer de rir.

O Natal, essa mulher passou ouvindo que o Papai Noel morreu. Como é que alguém escuta isso nas festividades? Acho que é a mais triste música de Natal de todos os tempos. Estraga a festa de qualquer cristão. O autor, Assis Valente, matou-se. Não era pra menos. E o Taiguara? Não gosto nem de me lembrar, nesta vida sem amor que eu aprendi... pô!

Sei que os dias têm sido assim, difíceis, desde que a vizinha se mudou para cá. Realmente, eu era feliz e não sabia... acho que já estou ficando paranóico. Mas ouvi uns boatos no corredor e me parece que ela vai-se mudar. Animei-me, penso que poderei novamente ser alegre. Vou chamar os amigos e fazer uma festa. Baixar uma coletânea da Cláudia Leite no mp3 e mandar ver. Sorrir e ser feliz, como antes. Chega de saudade.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Não sabia bem o que fazer. Seus pés estavam levemente descontrolados.
Segurou com uma mão, depois com as duas. Seu olhar não se fixava. Ele quis ajudá-la, colocou a mão por cima das dela e disse: é só começar, você vai ver como é fácil... depois não vai mais querer parar. Até acreditava. Quase todas as pessoas que ela conhecia gostavam – por que com ela seria diferente?
Mas havia algo que a incomodava naquele momento. Não sabia bem o que era, talvez fosse o cheiro, um cheiro de novo, talvez a falta de cumplicidade com ele. Perguntou: você já fez isso com muita gente, né? Já, claro. E ninguém desistiu? Não, até hoje não, você vai ser a primeira? Não, não, vamos lá!
Girou a chave na ignição e foi.