*no quintal de casa cada um faz o que quer. porque esse quintal é grande, do tamanho que a gente fizer. uma rede pra se balançar e balançar os pensamentos ele tem. tem um pé de limão, uma goiabeira, uma porção de plantas e flores e uns cachorros pra bagunçar o coreto. criança e adulto querendo ouvir história também sempre aparecem. e a gente conta. histórias de quintal. *
quarta-feira, 29 de novembro de 2006
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Já anoitecera quando desceu da árvore. Quarenta e dois passos apenas (ela havia contado muitas vezes) a separavam de casa, mas sabia que a mãe não iria gostar de vê-la chegando àquela hora. Sabia também que lhe pediria explicações - Por que fez o que fez? Explicações preparadas, entrou em casa. Desarmada que foi pela cena da mãe com a cabeça afundada entre os braços e os braços na mesa, só pode falar: Ele vai voltar, mãe. Não fica assim.
Mas a mãe não levantou a cabeça e nem parecia lhe ouvir. O pai havia ido embora e agora aquilo.
Ela achava (achava nada, tinha certeza) que estava fazendo a coisa certa. Não a toa passaria o dia inteiro planejando, combinando... instruindo o bicho. A idéia de que ele conseguiria trazer o pai de volta lhe parecia bastante razoável, louvável até. Imaginava o azulão bicando os ombros do pai e cantando sem parar em seus ouvidos. Era impossível que ele não reconhecesse seu pássaro, que não entendesse o recado e que não voltasse, comovido, a viver com a família. Para a menina, tudo era muito simples, inclusive a pequena viagem de algumas centenas de quilômetros que o azulão faria à procura do pai em outra cidade. Claro que o encontraria, claro.
Mas essas coisas, que lhe passaram num instante, ficaram só na sua cabeça, porque notou que a mãe não estava para conversa; não quis gastar saliva e ter de repetir tudo depois.
No dia seguinte, ao voltar da escola, não encontrou a mãe. Acreditou que ela pudesse estar na praça da cidade. E estava.
Parada em frente ao chafariz seco com a gaiola do azulão aos pés, a mãe cantava. Ninguém parado a olhava ou a ouvia, e ninguém mais a olharia ou a ouviria sem o canto melodioso do pássaro acompanhando sua música. Dinheiro então, quem daria?
Palpitando na cabeça da menina, uma pergunta: Será que serve se eu cantar com ela?
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6 comentários:
Ai que coisa mais linda!!!!!! dá vontade de chorar. arrepiei!
Que história boa! Dá vontade de ter mais ... tem?
veremos...
ó o azulãozim aí!!!
será que ele traz meu amor tumém? ou minha juventude? ehehehehe!!!
que delícia de texto!
dá saudade de alguma coisa que nem sei o que...
Muito triste, Lídia!!!! E ainda envolveu os pobres dos passarinhos... Fiquei com peninha...
Mesmo assim está muito bonito o texto.
Bjs da Sá.
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