*no quintal de casa cada um faz o que quer. porque esse quintal é grande, do tamanho que a gente fizer. uma rede pra se balançar e balançar os pensamentos ele tem. tem um pé de limão, uma goiabeira, uma porção de plantas e flores e uns cachorros pra bagunçar o coreto. criança e adulto querendo ouvir história também sempre aparecem. e a gente conta. histórias de quintal. *
terça-feira, 27 de fevereiro de 2007
Para Mariana
Quando me virei para pegar o jornal, meti as unhas na parede. De bico. Pressenti a dor. Fechei os olhos e esperei que viesse. Ela veio. Intensa. Fiquei com os olhos fechados durante alguns minutos. Imaginei os dedos da mão enormes, vermelhos, com o sangue fluindo para as pontas e coagulando, tornando-as, aos poucos, pretas, até arrebentarem. O líquido podre caindo e se espalhando pelo chão do quarto. A dor começou a passar. Abri os olhos e mirei minhas mãos. Estavam normais, nem sequer vermelhas. Pálidas, as unhas pequenas e arrebitadas como sempre. Bobagem, pensei. Onde já se viu sangue coagulado se espalhar pelo chão?
quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007
Caipira
A água jorrando da torneira batia nas costas das mãos, brincando entre os dedos. Com um movimento brusco, ela conseguiu com que as gostas caíssem com mais força, fazendo furinhos na espuma dentro do tanque. Parada, olhando os movimentos da água sobre a espuma, lembrou-se do mar. Como era bom o mar. Há quanto tempo ela não via aquela imensidão de água.
Da única vez que fora ao litoral, aos quinze anos, guardava boas lembranças. No início, a timidez. Vergonha de se despir, branquela e gordinha, diante daqueles corpos bronzeados. A tia insistindo para que entrasse logo na água.
Aos poucos, tomando coragem, esquecida do maiô fora de moda, foi colocando os pés na água, entrando de mansinho. Um misto de receio e alegria; as ondas batendo nas coxas. Por um instante imaginou que a massagem da água poderia lhe modelar as pernas e deixá-las como as das modelos de revistas.
Logo, coberta pela água até os ombros, não pensava em mais nada. O mar todo a envolvia e era como se ela toda o envolvesse. Uma união nunca sentida antes. Despertou do transe com os gritos da tia, pedindo para que não fosse muito longe. Voltou devagarinho, sentindo aos poucos cada parte do corpo que se expunha ao ar.
Já não via os corpos perfeitos, os biquínis modernos. Só aquela sensação de perda, aos pedaços, como se sua pele houvesse ficado lá, dentro do mar. Colocou a saída de paia e sorriu para a tia.
Da única vez que fora ao litoral, aos quinze anos, guardava boas lembranças. No início, a timidez. Vergonha de se despir, branquela e gordinha, diante daqueles corpos bronzeados. A tia insistindo para que entrasse logo na água.
Aos poucos, tomando coragem, esquecida do maiô fora de moda, foi colocando os pés na água, entrando de mansinho. Um misto de receio e alegria; as ondas batendo nas coxas. Por um instante imaginou que a massagem da água poderia lhe modelar as pernas e deixá-las como as das modelos de revistas.
Logo, coberta pela água até os ombros, não pensava em mais nada. O mar todo a envolvia e era como se ela toda o envolvesse. Uma união nunca sentida antes. Despertou do transe com os gritos da tia, pedindo para que não fosse muito longe. Voltou devagarinho, sentindo aos poucos cada parte do corpo que se expunha ao ar.
Já não via os corpos perfeitos, os biquínis modernos. Só aquela sensação de perda, aos pedaços, como se sua pele houvesse ficado lá, dentro do mar. Colocou a saída de paia e sorriu para a tia.
quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007
Aprendizado
Do mesmo modo que te abriste à alegria
abre-te agora ao sofrimento
que é fruto dela
e seu avesso ardente.
Do mesmo modo
que da alegria foste
ao fundo
e te perdeste nela
e te achaste
nessa perda
deixa que a dor se exerça agora
sem mentiras nem desculpas
e em tua carne vaporize
toda ilusão
que a vida só consome
o que a alimenta.
Ferreira Gullar
abre-te agora ao sofrimento
que é fruto dela
e seu avesso ardente.
Do mesmo modo
que da alegria foste
ao fundo
e te perdeste nela
e te achaste
nessa perda
deixa que a dor se exerça agora
sem mentiras nem desculpas
e em tua carne vaporize
toda ilusão
que a vida só consome
o que a alimenta.
Ferreira Gullar
terça-feira, 13 de fevereiro de 2007
Hoje, enquanto eu tomava banho, minha irmã ligou. O Luis atendeu e repassou a pergunta: A mãe já te ligou? Não. (Por que? Deveria ter ligado? Fiquei pensando com meu umbigo... na noite anterior tinha sonhado que um primo morrera. Ih, morreu alguém...) Aí ele falou que minha irmã estava avisando que a vó tinha ido embora. Essas foram as palavras do Luis, que é uma criatura sensível... Mas é isso, minha vó morreu. A única que conheci. A que todo mundo achava que não iria morrer, de tantas que foram as vezes que quase morreu – parente do Highlander, eu falava. A que enterrou, no ano passado, uma das filhas que cuidava dela. Enfim morreu. Eu, daqui de longe, nem consigo chorar. Minha mãe também não deve estar chorando. Aliás, acho que todos vão ficar descansados agora - inclusive o vô, ainda que vá sentir falta das rabugices da mulher com quem viveu mais de sessenta anos.
sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007
sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007
Boas respostas para perguntas bobas
O "para sempre" sempre acaba?
Humm... Sempre acaba? Mas têm “para sempres” que são ótimos quando acabam.
Desde sempre sempre espero que não.
Rir é o melhor remédio?
Diria um dos melhores. Junto dele está o sexo, a acupuntura e a neosaldina (não necessariamente nessa ordem)
Com certeza! Só é preciso tomar cuidado com o local e motivo pelo qual se ri.
Rir é o melhor remédio? Tem remédio que faz rir...
Que cor tu terias se derretesses?
Vixe! Num derreto não... Calor específico muito, muito alto!
Sabe banha derretida? Então.
Língua solta implica rabo preso?
Às vezes. Mas rabo solto implica várias línguas soltas, sempre.
Teus olhos são fãs de que beleza?
Prefiro o método braile.
Racionalizar o amor é não amar?
O mito do amor romântico é uma estratégia do sistema capitalista, ideologicamente imposta, que mantém as pessoas, principalmente as mulheres, presas ao núcleo familiar monogâmico, necessidade imperiosa desse sistema para sua própria perpetuação. Portanto, amor - tanto a relação afetivo-sexual entre duas pessoas, quanto outras formas, como amor maternal, filial, fraternal, etc. - é uma questão cultural, portanto, variável. Ih, racionalizei?
Prêmio da megasena acumulada ou a paz na Terra?
Ah, paz na Terra, vai.
Paz na terra, e na minha conta bancária.
Bom é não saber o quanto a vida dura?
É. O pessoal que trabalha com previdências privadas é que não deve achar isso.
A vida dura?
Qual é a tua primeira lembrança dessa vida?
Quando eu fugi de casa aos quatro anos com o meu coleguinha para ir ao parquinho. A segunda lembrança é a da palmada na bunda que eu levei depois.
Inveja dos meus irmãos. Eles tinham dever de casa, e eu, palhacinhos de colorir. humpf.
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