Recortado e costurado do capítulo 17 do Pequeno tratado das grandes virtudes, de André Comte-Sponville.
Que ele seja uma virtude poderá surpreender. Mas é que toda a seriedade é condenável, referindo-se a nós mesmos. O humor nos preserva dela e, além do prazer que sentimos com ele, é estimado por isso.
Se “a seriedade designa a situação intermediária de um homem eqüidistante entre desespero e futilidade”, como diz lindamente Jankélévitch, devemos observar que o humor, ao contrário, opta resolutamente pelos dois extremos.
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Um pouco de humor, um pouco de amor: um pouco de alegria. Mesmo sem razão, mesmo contra a razão. Entre desespero e futilidade, às vezes a virtude fica menos num meio-termo do que na capacidade de abraçar, num mesmo olhar ou num mesmo sorriso, esses dois extremos entre os quais vivemos, entre os quais evoluímos, e que se encontram no humor. O que não é desesperador para um olhar lúcido? E o que não é fútil, para um olhar desesperado? Isso não nos impede de rir do que vemos, e é sem dúvida o que de melhor podemos fazer.
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Quando é fiel a si, o humor conduz antes à humildade. Não há orgulho sem espírito de seriedade, nem espírito de seriedade, no fundo, sem orgulho. O humor atinge este quebrando aquele. É nisso que é essencial ao humor ser reflexivo ou, pelo menos, englobar-se no riso que ele acarreta ou no sorriso, mesmo amargo, que ele suscita. É menos uma questão de conteúdo do que de estado de espírito.
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Mas o humor não está apenas a serviço da humildade. Também vale por si mesmo: ele transmuta a tristeza em alegria (logo o ódio em amor ou em misericórdia, diria Spinoza), a desilusão em comicidade, o desespero em alegria… Ele desarma a seriedade, mas também, por isso mesmo, o ódio, a cólera, o ressentimento, o fanatismo, o espírito sistemático, a mortificação, até mesmo a ironia. Rir de si primeiro, mas sem ódio. Ou de tudo, mas apenas enquanto se faz parte desse tudo e se o aceita.
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O espírito zomba de tudo. Quando zomba do que detesta ou despreza, é ironia. Quando zomba do que ama ou estima, é humor. O que mais amo, o que estimo mais facilmente? “Eu mesmo”, como dizia Pierre Desproges. Isso diz o suficiente sobre a grandeza do humor, e sobre sua raridade. Como não seria uma virtude?
5 comentários:
Nooooooooooooooooooossa!
sem comentários!
Dicotomia da auto-ajuda. Que eu desprezo.
Ah! Esse paulista!
Que tem demais um pouco de mel na chupeta! hehehhehhe
Que desprezo é esse que se dá ao trabalho de ler e comentar?
É ironia, tolinha... (vide sua própria postagem)
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