Olhos céleres se moviam no escuro. Eram estranhas aquelas ruas, mas ele seguia o caminho indicado pela garçonete sem se desviar. Devagar, ia de viela em viela até encontrar a sua. Ou melhor, a dela. Parou em frente à porta com o número 113 – o 3 caído parecendo um € o fez sorrir. Ouviu uma música na voz de Elis Regina vindo da entrada ao lado; uma música que tocou no primeiro e único encontro deles. Se já não estivesse pensando bobagem, começaria a pensar naquele momento. Cantarolando “quando olhaste bem nos olhos meus...” bateu na porta.
Ela abriu e fez o mesmo gesto que o encantou quando se conheceram – um meneio de pescoço que nunca vira igual. Um sinal para que entrasse. Ele demorou a reagir, lembrando daquele dia, da cordialidade daquela boca que agora, fechada, lhe parecia tão indiferente. Sentou ao lado dela, observando que os lençóis eram os mesmos, embora a cama e o quarto não fossem.
Quando foi perguntado sobre o que estava fazendo ali, tentou agarrá-la pela cintura e ouviu um claro e intenso não. Como não? Ela não podia dizer não. Não podia lhe dizer não. Ele tinha sentido o calor do beijo dela, do corpo dela, sabia que ela havia gostado. Assinale-se aqui que naquele mesmo dia ele foi tocado da porta para fora, mas isso foi depois. Depois do beijo, do sexo, do olhar. Como agora lhe dizia não?
A explicação dela foi rápida, ele não teve argumentos para retrucar e foi embora.
De volta ao bar, a garçonete lhe perguntou:
- Encontrou a Cigana?
- E aí? Resolveu a questão?
- Ah... ... Me vê um conhaque aí, vai.
- Tem dinheiro? Não faço fiado aqui não.
- Engraçado, já ouvi isso hoje...